CONTINUE A ANDAR

Vale do Pati, Dezembro 2024 

Diário dividido em 4 textos, um para cada dia de trilha na Chapada Diamantina, Bahia

Por Lulu Cirne

Dia 4: Continue a andar

Me assustam os sinais mágicos que de repente aparecem quando me encontro em oração. São sinais impossíveis de interpretar através da mente racional, apenas confiar que há algo que nos escuta, nos vê e nos acompanha, muito além de nós mesmos. Aconteceu quando entrei novamente na igrejinha para me despedir, era um sinal de fé no amor.

Ontem à noite apareceu uma esperança, outro símbolo mágico, andava pelo chão entre nós. Tentamos colocá-la perto das plantas, ela retornou voando e de repente estava no cabelo da minha amiga. Ela escalava o cabelo como quem sobe uma árvore, quase fazendo uma trança, as patinhas incansáveis, se moviam rapidamente. Acho que a verdadeira esperança é assim mesmo: incansável, imortal. Ela não pára, não dá trégua, está sempre presente, dos momentos mais alegres aos mais confusos, sempre andando para frente. 

O dia de hoje teve uma caminhada muito longa, já que era o caminho de volta, com muito sol e muita subida para logo descer na saída do vale. Mas também teve água, de cachoeira e rio. A caminhada de hoje falava alto para mim uma frase que desde o primeiro dia sussurra em meu ouvido “continue a andar”. Já as águas me abraçam e me envolvem de amor. 

A experiência no Pati me dá vislumbres de conexão com o desapego e o amor real, aquele que nasce de dentro e se expressa para fora, aquele que sentimos quando nos conectamos com Deus. Uma sábia mestra me disse recentemente: “isso de que estamos abertos ou fechados para o amor é pura ilusão mental que criamos, porque na verdade somos amor, é a nossa natureza.” E é verdade, porém muitos esquecem, eu mesma esqueço e torno a lembrar. Neste momento me lembro: tudo que eu fizer, sempre farei com amor, mesmo às vezes me deparando com terrenos áridos e cheios de dor escondida debaixo de folhas verdes que na verdade estão secas.

O amor é uma descoberta individual profunda, é leve e ao mesmo tempo transparente, sem se esconder ou negar as próprias sombras. A única maneira de se descobrir no amor é entrando em um território de total aceitação de si mesmo e do outro, o que já assume a ideia de querer melhorar sempre, porém partindo do acolhimento e da aceitação. De toda forma, é preciso coragem para se vulnerabilizar, se aceitar, se expressar com verdade, mesmo quando em silêncio. Como as águas que abraçam, entregam abundância, independentemente do mar calmo ou agitado, apenas entregando na totalidade, afinal tem dia pra tudo. 

Talvez seja um propósito de vida, enquanto guio a outros no caminho da autoaceitação, também o percorro, nessa confiança e esperança que sinto quando me conecto e me inundo de amor. Desejo que a vida nos ensine a sentir o amor realmente dentro de nós de maneira permanente, em abundância como a beleza deste vale, ainda que não seja linear. Que possamos estar descansando no amor, ser cuidadas, estar tranquilas, sem nos emaranhar nas confusões criadas pela nossa mente ou pela mente de outros. Como quando deito na pedra, sinto o sol me aquecer e a água da cachoeira correr, eu como parte de tudo isso, sem separação.

Na chegada deste último dia minha amiga derrama algumas lágrimas, é gratificante finalizar o percurso. Foi lindo vê-la e saber que dividimos esses momentos, saber que ela topou minha proposta e agora se emociona. O amor é isso também, abraçar a ideia de um outro e apropriar-se dela, se permitindo com toda a abertura, sem ressalvas.

Quando converso com o Amor e lhe pergunto porque, se ele é tão lindo, às vezes se confunde (ou me confunde) com a dor, ele apenas me diz: seja como a esperança e continue a andar. Em algum momento fará sentido.

¡Más inspiraciones!

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